Regime Fácil: Abertura de Capital por Companhias de Menor Porte

Regime Fácil: Abertura de Capital por Companhias de Menor Porte

Entenda como o regime Fácil poderá facilitar a abertura de capital por companhias de menor porte

Será que começaremos a ver no mercado brasileiro ofertas públicas iniciais (IPO) de ações de companhias de menor porte (“CMP”) com maior frequência?  

A Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) divulgou, em 11 de setembro de 2024, consulta pública para regulamentar, em caráter experimental, o regime de Facilitação do Acesso a Capital e de Incentivos a Listagens (“Fácil”), disciplinando o disposto o artigo 294-A da Lei das S.A.

Publicamos anteriormente conteúdo sobre as principais propostas de simplificação apresentadas pela CVM para regulamentação do Fácil, o que inclui, dentre outros:

(a) obtenção de registro de emissor de valores mobiliários automático, após listagem em entidade administradora de mercado organizado;

(b) substituição do formulário de referência, prospecto e lâmina por um único formulário (denominado, Formulário Fácil), apresentado anualmente ou por ocasião de ofertas públicas;

(c) realização de ofertas públicas diretas com dispensa de registro na CVM e da obrigatoriedade de contratação de coordenador líder; e

(d) divulgação de informações contábeis em periodicidade semestral, em substituição à periodicidade trimestral atualmente aplicável às companhias abertas.1

A autarquia pretende incentivar o acesso ao mercado de capitais por empresas que se encontrem numa faixa intermediária entre o crowdfunding de investimentos e o mercado tradicional de valores mobiliários. O crowdfunding atende empresas com até R$ 40 milhões de receita bruta anual e que desejam realizar ofertas públicas de até R$ 15 milhões, conforme a Resolução CVM 88/22.

Para isso, propõe-se a exclusão ou redução de certos requisitos e obrigações previstas nas resoluções tradicionais das companhias abertas (majoritariamente, na Resolução CVM nº 80/22 e Resolução CVM nº 160/22).

O Mercado de Acesso

O alternative investment market (AIM), instituído na Inglaterra, em 1995, foi o primeiro modelo de mercado de acesso que se tem registro. A lógica é estabelecer um ambiente com uma regulamentação mais flexível em razão das características das empresas de menor porte.

No Brasil, o acesso de empresas de menor porte ao mercado de capitais é bastante tímido.  Apesar do mercado de dívida brasileiro se encontrar atualmente aquecido, as CMPs encontram dificuldades para encontrar boas ofertas de crédito, especialmente considerando a taxa de juros de dois dígitos atualmente vigente no Brasil, o que torna a dívida mais cara.

O Ministério do Empreendedorismo estuda iniciativas que para ajudar o desenvolvimento do mercado de acesso no Brasil, o que pode incluir isenções para novos emissores e a constituição de fundos de apoio para listagem.

A BEE4: será a bolsa brasileira das CMPs?

A BEE4 é um mercado de balcão organizado, autorizado pela CVM no âmbito do seu sandbox regulatório. A plataforma vem se posicionando como um ambiente de negociação em blockchain de tokens representativos de ações, com foco em pequenas e médias empresas (PME).2

Sua operação iniciou-se em 2022 e, desde então, quatro empresas listaram-se na BEE4: Plamev Pet (PLMV4), Engravida (BABY3), Mais Mu (MUUU4) e Eletron Energia (ELEN4).   

A participação de empresas no mercado organizado exige um nível mínimo de maturidade de gestão e governança do negócio, bem como o atendimento de determinadas condições para listagem.

Atualmente, a BEE4 estabelece, dentre outros, os seguintes pré-requisitos para listagem: (a) ser uma sociedade anônima; (b) possuir um faturamento anual entre R$ 10 milhões e R$ 300 milhões no ano anterior; (c) realizar auditoria independente das demonstrações financeiras por auditor autorizado pela CVM; e (d) ser uma empresa operacional há pelo menos 12 meses.  

Vale destacar que a BEE4 conta com consultores de listagem. Estes profissionais auxiliam as empresas interessadas durante todo o processo de listagem, incluindo a realização de diligências e preparação de governança.  

Ofertas Públicas por CMP Não Registradas na CVM

O mero enquadramento de uma companhia como “de menor porte” já a permitirá acessar o mercado de capitais em condições facilitadas, mesmo que não seja um emissor de valores mobiliários registrado na CVM.

Conforme a norma proposta, as CMPs não registradas na CVM poderão realizar ofertas públicas de valores mobiliários representativos de dívida, destinadas a investidores profissionais, sujeitas, no entanto, ao limite máximo de R$ 300 milhões para o valor total de ofertas públicas realizadas nos termos das ofertas disciplinadas na norma do regime Fácil, com exceção daquelas que observem integralmente a Resolução CVM nº 160/22.

As CMPs não registradas na CVM poderão realizar tais ofertas públicas sem a obrigatoriedade (a) de contratação de coordenador líder para a oferta e (b) de auditoria das demonstrações financeiras do emissor, desde que os investidores adquirentes assinem termo atestando ciência e responsabilidade por essa última dispensa.3

Por outro lado, (a) os valores mobiliários objetos destas ofertas somente poderão ser revendidos para investidores profissionais e (b) as CMPs não registradas que realizarem esse tipo de oferta deverão prestar uma série de informações.

Conclusão

A proposta do Fácil representa um marco significativo para o mercado de capitais brasileiro, sinalizando mudanças potencialmente transformadoras para as CMPs.

A redução de exigências, como registro automático, documentação simplificada e divulgação semestral de informações contábeis, pode representar um incentivo para que empresas considerem a abertura de capital como uma estratégia viável de captação de recursos.

A iniciativa dialoga diretamente com experiências internacionais bem-sucedidas e reflete uma tendência global de democratização do mercado de capitais. Além disso, o surgimento de plataformas como a BEE4 demonstra que há um ecossistema em formação para apoiar esse novo modelo de listagem.

O sucesso dessa iniciativa dependerá não apenas do arcabouço regulatório, mas também do engajamento de empreendedores, investidores e instituições de apoio. Embora seja prematuro afirmar definitivamente que teremos uma nova realidade de abertura de capital para CMPs, os sinais são promissores.

A CVM prorrogou o prazo para recebimento de sugestões e comentários, que se encerra dia 18 de dezembro de 2024.


  1. Segundo um levantamento contratado pela CVM, o custo com a elaboração de informações trimestrais sujeitas a revisão por auditores independentes consiste no principal custo financeiro incorrido pelas companhias abertas em decorrência de obrigações de caráter infralegal. ↩︎
  2. Informações conforme o site da BEE4. ↩︎
  3. A CVM vedou a possibilidade de regimes próprios de previdência social, entidades fechadas de previdência complementar e fundos e outros veículos de investimento, cujos recursos provenham predominantemente dos agentes indicados anteriormente, participarem de ofertas públicas de CMP não registradas. ↩︎

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